A pandemia gerou muitos problemas e ainda trará grandes consequências a longo prazo que são imensuráveis em todos os segmentos da sociedade.
No entanto, percebe-se algumas mudanças significativas. Por vezes uma crise muito grande desencadeia algo extraordinário. E assim aconteceu em Canabarro, bairro da cidade de Teutônia/RS. No início da pandemia, havia uma preocupação muito grande com as primeiras situações de demissões e pedidos de cestas básicas. Voluntárias da Comunidade Redentor se dispuseram a costurar aventais e mascaras para os profissionais da saúde. A inquietação e angústia permaneciam para algumas pessoas. Havia a procura para fazer trabalho voluntário. “Em que posso ajudar”? Como pastora e fomentadora de lideranças essa é uma pergunta que sempre queremos ouvir no trabalho em comunidade.
Assim surgiu a proposta da Horta Comunitária. Fazer algo a mais do que só distribuir cesta básica. Afinal, ali não tinha proteína animal nem verduras para uma alimentação saudável.
Com o trabalho que o CAPA/Núcleo Santa Cruz do Sul (RS) desenvolve há vários anos com o grupo de Saúde Comunitária Vida Digna, em Canabarro, tínhamos um terreno de potreiro onde estavam plantadas algumas arvores frutíferas de um projeto em andamento. Foram preparados os primeiros canteiros e as primeiras doações vieram da empresária Monica Wassen, da TeutoAgro Petshop e da psiquiatra Michele Valent, que são admiradoras e parceiras do projeto. Ao divulgarmos os primeiros passos na pagina do facebook da Paróquia Evangélica Teotônia Sul, recebemos doações de sementes, mudas de hortaliças e plantas medicinais.
Parcerias com empresas se fizeram necessárias para termos hortaliças para doar para as famílias carentes. Logo contamos com a simpatia e parceria incondicional da Cooperativa Languiru que primeiramente forneceu em torno de 650 mudas de alfaces. A Cooperativa doa regularmente mudas de hortaliças e sementes, além de assessoria técnica para plantio e preparo do solo.
Quinzenalmente, o agrônomo do CAPA, Lauderson Holz realiza uma atividade de formação e uma roda de bate-papo com as pessoas voluntárias sobre o manejo e preparo do solo, assim como planejamento de plantio e semeadura para cada período e reutilização dos canteiros.
Lauderson também cultiva mudas em sua estufa e traz várias para o plantio coletivo. Assim como demais voluntárias e vuluntários. Após a colheita, a distribuição das verduras e frutos da terra é entre todas e todos, por quem planta e quem mais precisa.
Ao longo do tempo, pessoas voluntárias foram se juntando ao projeto da horta. Percebemos que hoje não é mais um sonho que se sonha só. É um sonho comum, coletivo.
A horta comunitária tem uma proposta bem diferente do que foi visto até o presente momento. Como o nome mesmo diz “comunitária”, é uma horta de uso coletivo. Como tudo o que semeamos e plantamos é doação, então as pessoas voluntárias definiram que o consumo deve ser feito por pessoas em diversas situações de vulnerabilidade social: mulheres sozinhas com crianças, pessoas desempregadas e de baixa renda, idosas e idosos com baixa renda, famílias atendidas pelo CRAS e CREAS, Hospital Ouro Branco, na comunidade local, casas geriátricas e entidades afins.
Plantamos alimentos saudáveis para outras pessoas consumirem. A proposta tomou visibilidade rapidamente na cidade e doações de mudas e sementes são trazidas por muitas e muitos.
A mudança de pensamento é mais demorada e difícil. Atualmente a nossa proposta solicita às pessoas que venham até a horta buscar seus alimentos e escolham conforme seu gosto. Normalmente, muitas famílias estão acostumadas a receber em casa cestas básicas ou as buscam no CRAS. Vir colher e escolhê-las na horta exige mudança e atitude.
Acreditamos ser fundamental que cada pessoa escolher o que gosta de comer e o que quer experimentar de novo na sua alimentação. É uma questão de dignidade humana. O público estranhou a doação gratuita de hortaliças. Então, para um maior comprometimento e mudança de hábitos, estamos promovendo quinzenalmente o dia de feira solidária e dia de troca-troca, ou seja, as pessoas vêm para a nossa horta, podem doar em dinheiro, mudas ou sementes e levam hortaliças, chás e temperos. A adesão a essa proposta está sendo muito significativa. “Levo algo que tenho, que posso doar e pego as verduras que gosto de comer. Fresquinhas e sem veneno”! Assim a ideia se multiplica e promovemos a autonomia e sustentabilidade da horta.
A Proposta da Horta não foi escrita e planejada passo a passo. Desde o início, tínhamos muito claro que queríamos transformar o consumo e hábitos alimentares das pessoas e espalhar uma cultura do coletivo, da empatia com o sofrimento e a fome da outra pessoa. Assim, vamos seguindo passo a passo em planejamento coletivo conforme cada situação ou necessidade.
O distanciamento social nos impede de ir estar na cozinha preparando receitas, extratos e pomadas. Será nosso próximo passo. Agora, sob a sombra de uma árvore frondosa, o grupo tem sentado em troncos para rodas de bate-papo. Trocas de receitas se dão em espaço aberto e a partilha é rica em bem querer.
Artigo escrito pela Pastora Cristiane Echelmeier – Paroquia Teutonia Sul, coordenadora da Horta Comunitária.
Para maiores informações ou contribuir com a atividade da horta comunitária que atualmente busca verbas para o projeto de irrigação do local, contate com a Pastora Cristiane pelo e-mail [email protected].