O mês de agosto marca o aniversário de 15 anos da Cooperativa Regional de Agricultores Familiares Ecologistas (Ecovale), em Santa Cruz do Sul (RS), ligada ao Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor (CAPA). A entidade, que surgiu a partir da proposta de fortalecimento da agroecologia no Vale do Rio Pardo, comemorou a data no dia 16, com um culto na Comunidade Martin Luther, da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), apresentação em vídeo de relatos de produtores rurais ligados à cooperativa, espaço artístico-cultural, almoço e animação musical durante à tarde.
O coordenador do CAPA/Núcleo Santa Cruz do Sul, Sighard Hermany, explica que a organização lidera desde a década de 80 na região uma proposta de diversificação produtiva e de renda baseada na agricultura agroecológica. Ao longo dos anos, diante dos desafios para acessar novos mercados, surgiu a necessidade de estruturar uma nova formatação para o trabalho. “Os agricultores precisavam de um espaço mais consistente e de amparo legal para venda”, explica. No dia 12 de agosto de 2000, a Ecovale surge de maneira oficial, com 20 famílias integradas inicialmente. “Ao longo dos anos a gente vem se fortalecendo e buscando novos mercados.”
Hermany lembra que em 2002 a entidade forneceu mercadorias para alimentação escolar de maneira inédita no município de Vera Cruz, ainda antes do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). A ação pioneira é considerada um marco na história da Ecovale, que ainda hoje entrega produtos para a merenda de estudantes, sobretudo em Vale do Sol. Outro mecanismo de venda da gama produtos, que inclui hortigranjeiros e itens agroindustriais, é a loja própria da cooperativa (Rua Thomaz Flores, 805, em Santa Cruz do Sul), onde ainda ocorrem as feiras ecológicas nas terças e sextas-feiras, das 14 horas às 18h30.
Atualmente são 54 agricultores associados, de seis municípios da região, que também contam com parcerias para colocação dos alimentos. Entre os parceiros estão a Mercur e a Refeições Ao Ponto, para alimentação dos funcionários da indústria, além de outras cooperativas e pequenos estabelecimentos de produtos agroecológicos no Estado. Para fortalecer a proposta orgânica nas comunidades, as famílias da Ecovale se organizam em sete núcleos. “Os sócios se unem em uma mesma luta, vendendo seus produtos. Atuar em conjunto é muito importante na organização do trabalho”, destaca a presidente da entidade, Teresinha Weber.
Produção limpa tem história de desafios e avanços
Embora a proposta da agroecologia venha crescendo nos últimos anos, o engenheiro agrônomo Sighard Hermany destaca que um grande desafio ainda é o processo de convencimento dos agricultores para que conheçam as diretrizes da agricultura limpa. “A disputa ainda é muito forte com o agronegócio. A agricultura agroquímica tem toda uma estrutura de propaganda e vendas que faz o produtor acreditar que não é possível produzir de outra forma”, aponta. Além disso, reforça que agrotóxico e adubo químico não pagam impostos, subsídio que causa desigualdade no processo produtivo.
Para mudar paradigmas no campo e conquistar avanços, CAPA e Ecovale mostram os exemplos de famílias bem-sucedidas na agroecologia. “Demonstramos que é possível manter o mesmo nível de vida dos agroquímicos, com a compensação de ter trabalho mais saudável.” Na outra ponta da cadeia, Hermany lembra que os consumidores estão cada vez mais atentos à qualidade dos alimentos, mas que podem ser ainda mais exigentes, principalmente quanto à transparência do plantio. “Os orgânicos precisam de certificação, enquanto o mesmo não ocorre com produtos cultivados com agrotóxicos. Infelizmente agora ainda querem tirar a identificação da transgenia nos alimentos transgênicos”, lamenta.
O dirigente pondera que, mesmo devagar, os avanços são progressivos, especialmente em razão do processo de informação. Programas para monitoramento da quantidade de agrotóxicos utilizada na agricultura vêm provocando reações no comportamento dos consumidores brasileiros. As mudanças ocorrem sobretudo entre a juventude, puxada pela preocupação com as questões ambientais. Hermany lembra que a Escola Família Agrícola, que tem unidades na região, é um elemento importante e contribui diretamente com o desenvolvimento da agroecologia. Outro ponto positivo é o engajamento de diferentes atores em torno da temática, por meio da Articulação em Agroecologia do Vale do Rio Pardo (AAVRP).
Mulheres
Conforme a presidente da Ecovale, Teresinha Weber, desde o início a presença feminina é prioridade dentro da cooperativa. A produtora rural destaca que a discussão sobre a questão de gênero vem sendo reforçada nos últimos anos, alertando para a possibilidade de que as mulheres também se associem. Dos 54 associados da Ecovale atualmente, 24 são mulheres. Além disso, um dos núcleos da entidade é basicamente feminino e se dedica à produção de bolachas em Vale do Sol.
Michelle Treichel, Gazeta do Sul / Foto: Bruno Pedry