“Além de buscar garantir a saúde e a qualidade de vida de todas as pessoas, nosso trabalho é mostrar a viabilidade de construir uma agricultura sustentável a partir do material genético e das sementes produzidas pelos próprios agricultores. Não queremos ser apenas contra os transgênicos, temos que mostrar que a agricultura tradicional tem muito a ensinar e que a humanidade tem se sustentado em diferentes épocas e convivido com drásticas mudanças praticando uma agricultura em parceria com a natureza”.
O comentário é da coordenadora do Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor (CAPA)/Núcleo Pelotas, Rita Surita, e refere-se à decisão do Fundo Estadual de Apoio ao Desenvolvimento dos Pequenos Estabelecimentos Rurais (Feaper/RS) de suspender, em votação no dia 24 de abril, a distribuição de sementes transgênicas de milho no Troca-Troca de sementes para a safra 2012-2013. O programa, desenvolvido pela Secretaria de Desenvolvimento Rural, Pesca e Cooperativismo (SDR) do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, tem por objetivo facilitar a formação das lavouras dos pequenos produtores.
A decisão é uma grande vitória. Resultado da ampla mobilização do CAPA/Núcleo Pelotas e do Fórum da Agricultura Familiar (FAF), através do seu GT de sementes, os conselheiros do Feaper derrubaram por nove votos a seis a distribuição de sementes transgênicas como política pública e a aprovação da compra e distribuição pelo Estado de sementes crioulas.
Milho transgênico é o milho geneticamente modificado, criado e produzido por empresas multinacionais, que surgiu com uma nova promessa: resistir a determinados insetos e aumentar a produção. Os aspectos negativos, no entanto, não são divulgados. A semente transgênica, por exemplo, contamina as sementes crioulas tradicionais: assim, a cada ano, o agricultor precisa comprar novas sementes, ficando atrelado às multinacionais que detêm a tecnologia.
Ainda, sem ter sido provado que não faz mal à saúde, o produto já entrou na nossa cadeia alimentar.
Para Rita Surita, a posição do Feaper é fundamental para preservar e multiplicar as sementes de milho crioulo e para alertar sobre a contaminação através dos transgênicos. “Nossa preocupação é muito grande com a contaminação e com o desconhecimento por parte dos agricultores em relação ao tipo de sementes que estavam recebendo, e dos consumidores”, completa.
Segundo o engenheiro agrônomo do CAPA e coordenador do GT de sementes do Fórum da Agricultura Familiar, Roni Bonow, o movimento pela preservação e multiplicação das sementes de milho crioulo começou já em 2010, quando o conselho do Feaper inseriu as sementes de milho transgênico no programa troca-troca de sementes do estado. “Organizamos a jornada pela preservação do milho crioulo e realizamos na região sul um movimento para que os agricultores, prefeituras e sindicatos não pedissem as sementes transgênicas do troca-troca”, explicou.
“Além disso, construímos em conjunto com a União das Associações Comunitárias do Interior de Canguçu (Unaic) e a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) um projeto que doou 30 toneladas de milho crioulo para aproximadamente 6 mil famílias de agricultores familiares, alcançando ótimo resultados de produtividade, grande diversidade de sementes plantadas e multiplicação das variedades crioulas. E tivemos em abril uma dupla vitória, a retirada do milho OGM do programa e a inserção do milho crioulo e feijão para os agricultores familiares”, comemora Bonow.
Este ano, novamente o território Zona Sul, em uma ação do Fórum Regional da Agricultura Familiar em parceira com a Conab e com a Rede Bionatur de Sementes Agroecológicas, irá fornecer sementes de hortaliças para 3.900 famílias, incentivando o plantio orgânico e valorizando as sementes produzidas pelos assentados da região.
Texto: Rocheli Wachholz/CAPA Pelotas